Serasa vê 6,3 milhões de empresas com operações em atraso, maior número da série histórica
A inadimplência das companhias brasileiras começa a dar sinais de deterioração, refletindo a piora da situação financeira das famílias e os efeitos do aumento da taxa de juros. Esse cenário não deve mudar no curto prazo, segundo economistas, considerando as expectativas de desaquecimento da atividade.
O número de empresas inadimplentes cresceu 8,5% em outubro, na comparação anual, chegando a 6,33 milhões, segundo levantamento da Serasa Experian obtido pelo Valor. A quantidade é a maior já registrada desde o início da série histórica, em 2016.
O aumento reflete diretamente a menor capacidade das famílias de honrar suas contas em meio à alta dos preços, diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian. “A inflação puxou a inadimplência das pessoas físicas, que tem crescido desde outubro de 2021, e teve efeito também na inadimplência das companhias”, afirma. O avanço da taxa básica de juros (Selic) foi outro fator que teve peso negativo, já que elevou os custos para rolagem das dívidas das empresas.
Para Michael Burt, economista da LCA Consultores, a inadimplência das companhias também pode estar ligada ao vencimento das dívidas feitas ao longo da pandemia. Parte das empresas aproveitou o ambiente propício – com juros mais baixos e maior oferta de crédito – para reforçar o caixa e financiar as atividades. “Naquele momento, fazia muito sentido para as companhias negociarem suas dívidas, mas agora os prazos devem estar se aproximando e, dada a situação complicada, muitas delas não conseguiram cumprir com as obrigações”, afirma Burt.
A expectativa é que o cenário para as companhias não mude até, pelo menos, a metade de 2023. “Antes do fim do primeiro semestre, é pouco provável que a gente veja queda no indicador de inadimplência das empresas”, afirma Rabi. Para que a situação fique estável, diz ele, é necessário que a inflação caia “de forma consistente e não apenas por causa de fatores temporários” e que os juros parem de subir.
“Esse índice é um indicativo em cadeia, porque para parar de crescer é necessário que os consumidores consigam limpar seus nomes e quitem as dívidas que contraíram com as empresas, que, consequentemente, terão melhora no fluxo de caixa e, por sua vez, conseguirão pagar os compromissos financeiros atrasados que ainda possuem”, diz o economista da Serasa.
Burt acredita que, como o crescimento da inadimplência das empresas neste ano foi mais lento do que o das famílias, “há espaço para crescimento nos próximos meses”. Outros fatores influenciam a perspectiva negativa, segundo ele, como a piora da confiança do empresariado e o desaquecimento do consumo esperado para o fim deste ano.
Os dados da Serasa Experian mostram que cerca de 53% das empresas inadimplentes são do setor de serviços. As companhias do comércio correspondem a 38% do total, enquanto as do ramo industrial chegam a 8%. Considerando o porte, as micro e pequenas empresas representam quase 89% das companhias em atraso.
Dados do Banco Central divulgados nesta semana mostram que a inadimplência de pessoa jurídica subiu para 1,7% em outubro, com alta de 0,1 ponto percentual em um mês e de 0,3 ponto em 12 meses. A piora se deu sobretudo nas linhas com recursos livres, como cartões e capital de giro.
Os balanços dos bancos relativos ao terceiro trimestre mostram que os atrasos com o setor financeiros se concentram nas micro, pequenas e médias empresas. Nas grandes companhias, a inadimplência está nas mínimas históricas, que aproveitaram os anos de juros baixos para se desalavancar.
Fonte: Valor Econômico