O desemprego no país, de 12,3%, é maior do que em qualquer momento da recessão que abalou o país entre 2015 e 2016
Enfrentando fila em frente a uma agência de emprego no Rio de Janeiro, Thaysa dos Santos se diz disposta a aceitar qualquer oferta de emprego. Como os mais de 13 milhões de desempregados no país, ela não pode se dar ao luxo de ser exigente.
Enquanto a maior economia da América Latina corre o risco de voltar à recessão dois anos depois de uma crise devastadora, encontrar trabalho está mais difícil do que nunca.
“Hoje em dia é muito difícil”, diz a jovem de 27 anos, auxiliar administrativa há três meses em busca de um emprego em tempo integral.
“A gente não pode escolher segundo nosso currículo. Tem que pegar qualquer vaga”, explica.
O desemprego no país, de 12,3%, é maior do que em qualquer momento da recessão que abalou o país entre 2015 e 2016 e fez a economia encolher mais de 7%.
Um crescimento letárgico desde então – a economia se expandiu 1,1% em 2017 e 2018, e analistas apontando para um crescimento ainda mais lento este ano – desencoraja as empresas a aumentar sua folha de pagamento, apesar do governo de viés liberal empossado em janeiro.
O presidente Jair Bolsonaro, que assumiu o mandato com a promessa de impulsionar a economia, diz que a chave para o crescimento é a aprovação da reforma da Previdência, que enfrenta a resistência de sindicatos e de um Congresso hostil.
Com a pouca ajuda formal disponível, muitos desempregados dependem do apoio da família ou aceitam empregos informais, apesar disto significar ganhar menos e abrir mão de benefícios, como seguro de saúde e INSS.
Wanderson César, de 32 anos, está em busca de um trabalho permanente de segurança há mais de quatro anos.
Ele se considera afortunado pela esposa trabalhar como recepcionista. Com o dinheiro que ganha fazendo bicos, o casal consegue sobreviver.
“Sou homem, então preciso trabalhar para levar alimento para minha casa, preciso ajudar”, conta César, enquanto espera para entrar na agência de empregos.
Falta de investimento em educação
O problema não é apenas a falta de oportunidades. Algumas empresas lutam para conseguir candidatos qualificados para as vagas disponíveis, afirma Aline Cardoso, secretária do Trabalho em São Paulo.
“Isso pode ser tanto no nível mais técnico, mais sofisticado, em profissões muito tecnológicas, mas às vezes até em profissões mais básicas faltam profissionais qualificados”, diz ela.
O lastimável sistema educacional no país é parcialmente responsável.
Em 2017, o Banco Mundial estimou que os brasileiros de 15 anos vão precisar de 75 anos para alcançar a proficiência média dos adolescentes da mesma idade em países da OCDE em matemática e mais de 260 anos em leitura.
E isto se eles de fato concluírem os estudos. Apenas 69% dos brasileiros com idades entre 15 e 19 anos se dedicam aos estudos, reportou a OCDE no ano passado, uma das taxas mais baixas neste grupo.
Lúcia Santos está entre os muitos brasileiros que não conseguiram concluir os estudos. Esta jovem de 23 anos, mãe de duas crianças, procura há cinco anos um emprego de caixa em tempo integral.
“Agora é mais complicado porque eles [os empregadores] pedem o ensino fundamental completo”, lamenta ela, que parou de estudar na oitava série.
Desistência
O desemprego crônico está piorando no país.
O número de pessoas sem trabalho há mais de dois anos alcançou 3,3 milhões de pessoas no primeiro trimestre – um aumento de 42,4% em quatro anos, informou em pesquisa recente o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O desemprego prolongado pesa sobre quem procura emprego, explica Paulo Vasconcelos, coordenador do grupo de voluntários Comunidade Católica Gerando Vidas, que administra a agência de emprego.
“Temos gente com um ano, um ano e meio, dois anos desempregada”, diz Vasconcelos, reportando um aumento nos casos de depressão e desamparo entre aqueles que procuram trabalho.
“Este ano a gente começou a perceber que muitas pessoas que vêm procurar oportunidades de trabalho não têm nada em casa para comer”, acrescenta.
Alguns meses atrás, Yanca Castro, de 22 anos, viajou milhares de quilômetros de Manaus para o Rio em busca de uma oportunidade, que ela ainda está procurando.
Em São Paulo, Marcelo dos Santos está sem trabalho há 15 meses depois de perder o emprego na área da construção civil.
Ele se candidatou para várias vagas, mas até agora “ninguém o chamou”, conta este homem de 48 anos em uma agência de emprego pública.
“Passar 10, 15 meses [sem emprego] nunca aconteceu”, afirma.
Muitos acabam desistindo.
O número de pessoas que pararam de procurar trabalho no período de março a maio chegou a 4,9 milhões, batendo o recorde anterior de 4,8 milhões, segundo os últimos dados oficiais.
Sem solução fácil
O crescimento estagnado dificulta a criação de emprego, disse recentemente à AFP o economista do Ipea José Ronaldo Souza, alertando que a taxa de desemprego “pode piorar”.
Isto tem um efeito em cascata.
“Com tantos desempregados, provavelmente o aumento do consumo vai permanecer baixo”, diz William Jackson, do Capital Economics.
“É difícil ver outros motores de crescimento na economia brasileira: o crescimento global está fraco, o que vai conter as exportações, e a política fiscal está cada vez mais restritiva”, prossegue.
Não há solução fácil para um problema que Alex Agostini, da Austin Ratings, diz ser tanto estrutural quanto cíclico.
A falta de investimento em educação e treinamento em um país com uma grande população jovem intensificou o desemprego.
Apesar dos desafios, Thaysa diz que é otimista sobre o futuro.
“Tem que ser”, diz. “Tem bastante [competição], cada vez mais”.
Fonte: Exame.com